"Está frio mas venham!"
Quais são as grandes traves-mestras da programação deste Porto/Post/Doc?
Somos um festival com poucos filmes comparados com os outros festivais. Temos 60 filmes novos para serem mostrados durante uma semana e vamos fazê-lo através de focos novos em autores e na competição, na qual vamos mostrar cinema inédito. Escolhemos filmes nos quais vale a pena o investimento do espectador em descobrir o que é este cinema novo que nós anunciamos como as "histórias do real". O nosso foco centra-se em realizadores que a nossa equipa de programadores sente que são relevantes, como Lionel Rogosin, cineasta que foi nomeado para cinco Óscares, e Thom Andersen, que até tem uma ligação à cidade - foi aqui que filmou Reconversão. E há ainda uma homenagem reativa que o festival decidiu fazer à Chantal Akerman.
Na competição têm um filme de João Canijo e de Anabela Moreira, Portugal - Um Dia de Cada Vez, que já passou no circuito comercial. Não têm receio de serem criticados por isso?
O cinema português surge no festival de forma transversal, quer nas retrospetivas, quer na competição, quer ainda na secção temática Cinema Falado. É claro que nós queremos ter filmes em estreia, mas estamos na segunda cidade do país, estamos em dezembro e não conseguimos competir com certas estratégias da distribuição comercial. Sim, o filme de Canijo e Moreira acabou de se estrear nos cinemas, pois nós não tivemos o poder suficiente, enquanto festival, de fazer que o filme estreasse aqui! O facto de ter estreado comercialmente entretanto são outras prioridades que, muitas vezes, os produtores e os distribuidores dos filmes têm de anuir. Seja como for, é uma estreia na cidade do Porto, apenas tinha estreado em Gaia! Foi visto por quantos lá? E por quantos será visto aqui?
Antes do Porto/Post/Doc, a cidade era conhecida em termos de festivais pelo Fantasporto. Como olha para esse festival, sobretudo numa altura em que é falado por razões extracinema?
Só falarei de outros festivais se for para falar de cinema. Neste momento aquilo que se fala do Fantas não é de cinema.
Um dos trunfos do ano passado foi o lado social do festival. Neste ano também estão programadas festas e animações musicais na cidade...
Faço festivais há 1/4 de século e já fui a muitos festivais e aqueles que deram maior prazer são os que me fizeram sentir bem, em que fiz grandes descobertas e encontrei pessoas. O Porto/Post/Doc criou condições para as pessoas se sentirem cá bem. No ano passado, mesmo com o frio e a chuva, os nossos convidados sorriam porque também criámos condições para descobrirem a cidade. Está frio mas venham!
Trunfos do festival
Neste Porto/Post/Doc há uma ideia de programação, o festival ganha corpo. Dario Oliveira e a sua equipa de programadores pensaram um festival com o sinal dos tempos. É só pena que nesta edição número dois o festival insista em retomar títulos que estiveram no DocLisboa, mas ainda assim há grandes pérolas de cinema para descobrir na Baixa portuense de 1 a 8 de dezembro.
No Home Movie, de Chantal Akerman
O derradeiro filme da cineasta belga. Chantal filma obsessivamente a mãe e as suas memórias. Um documentário íntimo e intransmissível que vergonhosamente não teve reconhecimento no último Festival de Locarno mas que foi um dos sucessos do DocLisboa. Uma obra em que se pressente a presença da morte. Somos avisados de que a mãe retratada já não está no mundo dos vivos. O que estamos a ver é uma espécie de registo afetivo de uma resistência dos últimos dias.
No Home Movie é sobre aquilo que é mesmo íntimo. Um filme de uma imperfeição comovente, aliás, como todo o cinema desta cineasta que se suicidou inexplicavelmente.
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In Jackson Heights, de Frederick Wiseman
Mais outro dos títulos que transitaram do DocLisboa...A oportunidade para o público nortenho assistir ao novo filme do veterano documentarista americano, logo a seguir à estreia comercial de National Gallery, o seu filme de 2014. Desta vez, a câmara de Wiseman filma um bairro nova--iorquino em crise de identidade. Fica sempre bem a um festival programar um Wiseman...
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Blur: New World Towers, de Sam Wrench
Após No Distance Left to Run, de Will Lovelace e Dylan Southern, documentário de 2010 sobre a reunião de volta da banda, novo olhar sobre os Blur, os Blur já com as pazes feitas. É um dos bilhetes mais quentes do festival e passa em estreia nacional na muito aliciante secção Transmission, na qual está também o procurado Keith Richards: Sob Influência, de Morgan Neville, cedido pela Netfilx.
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O Evento, de Sergei Loznitsa
O novo filme do cineasta de A Minha Alegria (2010) é um olhar sobre material filmado acerca de um golpe de Estado falhado em 1991 que visava derrubar o poder comunista na Rússia. Loznitsa, habitué dos festivais nacionais, é um dos nomes consagrados de uma competição que também integra na sua seleção cineastas como João Canijo, Catarina Mourão e Luciano Piazza.
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A Glória de Fazer Cinema em Portugal, de Manuel Mozos
Um falso documentário imaginado pelo argumentista Eduardo Brito a partir de uma ideia genial: e se o escritor José Régio quisesse ter feito cinema português? Encomendado pelo Curtas Vila do Conde, esta curta-metragem de Mozos passa numa sessão a não perder da secção Cinema Falado, na qual será ainda projetado o novo filme de Albano Silva Pereira, Life Goes On.
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